Investimentos

Véspera de Super Quarta, encontros do G7 e escalada entre Israel e Irã: o que deve repercutir nesta terça-feira (17)?

Mercados globais recuperam fôlego após a aversão ao risco provocada pelos ataques de Israel ao Irã na semana passada.

Por Matheus Spiess

17 jun 2025, 08:20 - atualizado em 17 jun 2025, 08:22

ibovespa bolsa mercado ações

Imagem: iStock/ Edson Souza

No exterior, os mercados globais tentaram recuperar o fôlego na segunda-feira (16), após a onda de aversão a risco registrada na última sexta-feira (13), provocada pela deterioração do conflito no Oriente Médio. A escalada entre Israel e Irã segue em curso, mas, até aqui, os desdobramentos permanecem dentro do que os mercados já esperavam: Israel ataca sistematicamente alvos militares ligados ao programa de mísseis iraniano, enquanto o Irã responde com o que ainda lhe resta de arsenal balístico.

Apesar da gravidade da situação, o comportamento dos ativos sugere uma leitura mais contida por parte dos investidores — e, curiosamente, com um dólar que parece ter perdido parte de sua aura defensiva. A divisa americana, que historicamente se fortalecia em momentos de incerteza global, tem mostrado fraqueza desde o início do ano, pressionada por dúvidas persistentes sobre a sustentabilidade fiscal e comercial dos EUA. A “segurança” do dólar, nesse contexto, tornou-se um conceito mais retórico.

Do ponto de vista geopolítico, um ponto de alívio relativo veio com o sinal, ainda inicial, de que o Irã estaria disposto a retomar negociações em torno de seu programa nuclear — o que não chega a surpreender, dada a magnitude dos ataques israelenses recentes, que teriam infligido danos sérios e duradouros à infraestrutura iraniana. Se confirmada, essa ofensiva teria atrasado o programa por anos, talvez até décadas.

É claro que o risco de novas ondas de instabilidade na região segue no radar, mas a percepção marginal do mercado nesta segunda-feira foi ligeiramente mais construtiva. Ainda assim, o presidente Donald Trump, por exemplo, deixou a cúpula do G7 antes do encerramento oficial, retornando a Washington para tratar diretamente da crise.

Na seara monetária, tivemos o primeiro movimento de uma semana particularmente carregada de decisões de política monetária ao redor do mundo. O Banco do Japão manteve sua taxa básica em 0,5%, abrindo a série de anúncios esperados nos próximos dias — incluindo EUA, Brasil, Reino Unido, China e Turquia. O palco está montado. Agora, resta ver se os atores principais conseguirão conduzir o espetáculo.

· 00:59 — O governo coleciona mais uma derrota em meio ao caos global

No Brasil, o Ibovespa iniciou a semana em alta, acompanhando o movimento de recuperação global após a aversão a risco do último pregão. Mas o que realmente chama atenção é a resiliência quase surpreendente dos ativos locais, que caem menos quando o mundo desaba e reagem com mais vigor nos momentos de trégua. A explicação não é mística — está ancorada em fundamentos que vínhamos destacando desde o início do ano. Primeiro, a rotação global de capitais segue beneficiando o Brasil. Em um ambiente de realocação regional, o fluxo estrangeiro continua entrando. Segundo, a expectativa de fim do ciclo de aperto monetário, com possível alta residual de 25 pontos-base na Selic nesta Super Quarta, já reacende discussões sobre eventual corte de juros no fim do ano. Terceiro, a crescente percepção de que o atual governo perdeu o pulso da política fiscal e que, por isso mesmo, uma candidatura mais comprometida com o equilíbrio das contas públicas pode se tornar competitiva.

Tudo isso em um cenário internacional que, embora turbulento, não necessariamente aponta para uma recessão global iminente. E convenhamos: os balanços do último trimestre por aqui não vieram nada mal. O suficiente, inclusive, para justificar projeções ambiciosas, como a da Principal Asset Management, que fala em dobrar o valor da bolsa brasileira até as eleições presidenciais — aposta inspirada no “efeito Milei” e que, vale lembrar, não nos soa exatamente nova. Já vínhamos defendendo esse call há alguns trimestres. A Ashmore também engrossa o coro, com uma visão estruturalmente otimista para o Brasil, sugerindo mudanças de longo prazo que, segundo eles, “nunca antes se viu por aqui”. Confesso: é possível. Mas com Brasil, o ceticismo nunca é exagero. Ainda assim, não dá para ignorar o tom de otimismo que permeia o ar.

A prova? O dólar caiu ao menor nível em oito meses, reforçando a tese de que a redistribuição dos fluxos globais continua. A percepção de que ainda pode haver um último suspiro na Selic — sobretudo após a leve surpresa positiva no IBC-Br — turbina o diferencial de juros (o famoso “carry trade”) e torna o real mais atraente no relativo.

Em outras palavras, Brasília continua sendo um circo, mas os ativos seguem firmes no picadeiro. Falando em Brasília, o governo sofreu mais uma derrota política: a Câmara aprovou, em regime de urgência, o Projeto de Decreto Legislativo (PDL) que visa revogar a taxação do IOF. Haddad está de férias. Lula, no G7. E quem ficou encarregado da articulação? Rui Costa e Gleisi Hoffmann — justamente os nomes mais afeitos à sabotagem interna. É verdade que ainda há espaço para reverter o estrago, já que o mérito da proposta não foi votado. Mas a fraqueza do governo já ficou escancarada. E isso antes mesmo da instalação da CPI que investigará as fraudes no INSS, mais uma frente de desgaste para um Executivo já severamente desgastado.

A verdade é que a sociedade cansou. O discurso de aumento de impostos — ainda que sob o pretexto de corrigir distorções — já não cola mais, sobretudo quando não vem acompanhado de uma agenda séria de corte de gastos. E sejamos francos: esse governo nem tem convicção, nem capital político para propor algo nessa linha. O debate estrutural sobre o orçamento brasileiro, portanto, foi empurrado para 2027 — e a depender do resultado da eleição, podemos ver uma reforma de verdade. É por isso que o tal “rali eleitoral” tem ganhado tração: não se trata mais de especulação.

· 01:45 — Mantendo o tom de cautela

Nos EUA, os investidores parecem já ter virado a página dos recentes ataques no Oriente Médio. O comportamento dos mercados ontem foi emblemático: o Nasdaq subiu 1,5%, enquanto o S&P 500 avançou 0,9%, como se o noticiário geopolítico tivesse perdido peso. O gatilho? Sinais vindos do Irã de que há disposição para suavizar o conflito com Israel e retomar as negociações com os EUA sobre seu programa nuclear. Em outras palavras, o mercado precificou que a guerra não deve escalar — ou, pelo menos, não o suficiente para fazer preço por muito tempo.

Os temores mais drásticos que há anos habitam o imaginário ocidental — como um ataque iraniano a bases americanas na região, sabotagem à infraestrutura energética do Golfo ou o fechamento do Estreito de Ormuz — continuam não se concretizando. E, no pragmatismo brutal dos mercados, o que não acontece, não importa. O alívio em relação a esses riscos mais extremos tem, portanto, devolvido algum conforto aos investidores, que agora deslocam sua atenção para a tradicional política monetária.

A próxima reunião do Comitê Federal de Mercado Aberto (FOMC), que começa hoje (17) e se encerra amanhã, promete ser o verdadeiro divisor de águas da semana. A expectativa majoritária é de manutenção dos juros no atual intervalo entre 4,25% e 4,50%. Mas o que realmente importa é o subtexto — o tom do discurso, a linguagem corporal de Jerome Powell, as vírgulas nas entrelinhas. O mercado busca sinais mais claros sobre quando, afinal, o Fed pretende iniciar o tão aguardado ciclo de cortes.

Apesar de algum alívio recente na inflação, o argumento para paciência segue firme: o mercado de trabalho continua robusto e os efeitos das tarifas comerciais anunciadas recentemente ainda não foram plenamente absorvidos nos índices de preços. Em outras palavras, o Fed vê mais motivos para cautela do que para pressa. A cereja do bolo virá com a publicação do novo resumo das projeções econômicas: um mapa mental das autoridades do Fed sobre juros, inflação, desemprego e crescimento. 

· 02:34 — Saída abrupta

Donald Trump abandonou abruptamente a cúpula do G7, no Canadá. A saída repentina alimentou especulações de que os EUA estariam preparando um apoio mais enfático aos movimentos militares do primeiro-ministro israelense Benjamin Netanyahu contra o Irã, em meio à intensificação dos bombardeios sobre instalações nucleares iranianas. A decisão também custou a Trump uma reunião já agendada com o primeiro-ministro australiano, Anthony Albanese, enquanto um encontro anterior com o líder japonês Shigeru Ishiba fracassou em produzir qualquer avanço sobre um possível acordo comercial. Em suma, a presença do presidente foi marcada mais por ruídos do que por resultados — e sua saída prematura esvaziou ainda mais um G7 já esmaecido.

O resultado prático foi uma declaração final diluída, quase constrangida, dos demais líderes do grupo: pedem uma “distensão” no Oriente Médio, mas evitam clamar pelo fim imediato do conflito entre Israel e Irã. Para apimentar o clima, Trump declarou que excluir a Rússia do G7 (antes G8) foi um erro e que não veria problemas na entrada da China no grupo — afirmações que colidem frontalmente com o consenso ocidental.

O presidente Lula circula por lá, com algumas conversas bilaterais agendadas — nenhuma de especial relevância. Os grandes temas estruturantes que deveriam dominar a pauta, como comércio internacional, defesa coletiva e inteligência artificial, foram engolidos pelo noticiário geopolítico e pelo crescente abismo que separa os Estados Unidos de seus aliados tradicionais. Afinal, a visão de mundo que Trump insiste em empurrar é, no fundo, incompatível com a lógica multilateral que o G7, ao menos em tese, ainda pretende sustentar. O fórum, que já vinha perdendo protagonismo nos últimos anos, viu mais um capítulo de sua lenta erosão institucional.

· 03:23 — Qual o desfecho?

A escalada entre Israel e Irã continua ganhando tração. O objetivo central do primeiro-ministro Benjamin Netanyahu é claro e conhecido: desmantelar o programa nuclear iraniano. Mas os últimos desdobramentos sugerem que os planos de Israel podem ir além. Em declarações recentes, Netanyahu insinuou que eliminar o líder supremo iraniano encerraria o conflito. Não se trata apenas de uma bravata retórica: trata-se de uma sinalização explícita de que o verdadeiro alvo seria a própria estrutura de poder do regime iraniano. Em outras palavras, o que está em jogo pode ser não apenas a infraestrutura nuclear, mas a permanência do regime teocrático em Teerã.

Os sinais no tabuleiro militar reforçam essa leitura. Os EUA, sob a liderança de Donald Trump — que, ironicamente, prometeu em sua campanha retirar o país de “guerras eternas” —, deslocaram o porta-aviões USS Nimitz do Mar do Sul da China para o Oriente Médio. Além disso, mais de 30 aviões-tanque foram transferidos de bases americanas rumo ao leste do Atlântico. Ainda que essas movimentações possam ser atribuídas, formalmente, a exercícios da Otan ou operações rotineiras, o momento e o volume do reposicionamento militar conferem musculatura adicional à estratégia israelense. Na prática, é um claro endosso à ofensiva liderada por Netanyahu.

Curiosamente, enquanto mísseis ainda cruzam os céus, ganham força rumores sobre uma possível disposição iraniana de negociar. Há quem acredite que a ofensiva israelense já tenha causado danos significativos ao programa nuclear de Teerã — o suficiente para atrasá-lo em décadas. Se for verdade, trata-se de um golpe histórico em um dos principais pontos de tensão da geopolítica global. Um Irã instável, com ambições nucleares intactas, seria um risco à segurança  e estabilidade global.

A grande fragilidade do Irã está justamente na sua limitação operacional. Estima-se que Teerã tenha iniciado o conflito com cerca de 2 mil mísseis capazes de atingir território israelense. À medida que o estoque se reduz, a margem de manobra também encolhe. Sem o respaldo de aliados fortes — e com o Hezbollah, o Hamas, os Houthis e as milícias no Iraque já severamente desgastados ao longo dos últimos anos —, a capacidade de resposta do regime iraniano torna-se mais simbólica do que efetiva.

O cenário, portanto, caminha para uma conclusão previsível: um conflito militar de escopo limitado, restrito, mas com consequências potencialmente devastadoras para o Irã. O país, encurralado, tenta equilibrar sua sobrevivência política com a preservação de um programa nuclear que parece, neste momento, mais abalado do que nunca.

· 04:18 — Uma feira aérea

Tradicionalmente um palco de celebração para os grandes feitos da aviação global, o Paris Air Show começou ontem em Le Bourget envolto em um clima sombrio de crise, cautela e danos de reputação. Com mais de 2.400 expositores de 48 países reunidos para apresentar novidades e fechar acordos bilionários — incluindo Airbus, Embraer e Boeing —, o evento, desta vez, ocorre sob uma nuvem particularmente pesada.

O pano de fundo é trágico: o recente acidente com um Boeing 787 Dreamliner da Air India, que resultou na morte de ao menos 265 pessoas na semana passada, lançou uma sombra incômoda sobre o setor e, sobretudo, sobre a Boeing. A CEO da empresa, Kelly Ortberg, sequer compareceu ao evento, alegando a necessidade de supervisionar pessoalmente a investigação. A ausência da executiva simboliza o abalo na recuperação da fabricante americana, que, após anos de tropeços envolvendo falhas de segurança e problemas na linha de produção, ensaiava um retorno à normalidade.

Como se não bastasse, a aviação comercial enfrenta agora outros ventos contrários. O aumento dos custos operacionais, os gargalos persistentes nas cadeias de suprimento — agravados pelas tarifas protecionistas de Donald Trump — e a crescente incerteza geopolítica formam um cenário turvo. O risco de interrupções em rotas aéreas internacionais cresceu, e, mais recentemente, o espaço aéreo se tornou peça de xadrez em conflitos que vão do Mar Vermelho ao Leste Europeu. A guerra na Ucrânia, por sua vez, deu novo impulso aos orçamentos militares e reacendeu o interesse por aeronaves de combate, que ganharam protagonismo no evento. Não por acaso, os caças F-35 da Lockheed Martin e os Rafale da Dassault estão no centro das atenções.

E quem soube capitalizar foi a Airbus. A fabricante europeia dominou a abertura da feira, anunciando um volume impressionante de pedidos — perto de US$ 10 bilhões. A lista inclui até 77 jatos para a AviLease, da Arábia Saudita (10 A350 cargueiros, com 12 opções, e 30 A321 de passageiros, com 25 opções), 25 A350 para a recém-criada Riyadh Air (com opção de mais 25) e 40 jatos A220 para a polonesa LOT (com opção de 84 adicionais). Foi um show à parte — tanto nos números quanto na mensagem: enquanto a Boeing contém danos, a Airbus avança com apetite. E a Embraer? Resta saber se, até o fim do evento, ainda haverá espaço para os jatos brasileiros.

· 05:06 — Montando uma “superinteligência” em IA

A gigante por trás do Facebook, Instagram e WhatsApp — e, não por acaso, uma das principais apostas em inteligência artificial no mercado global — voltou a mirar alto. Sob a liderança direta de Mark Zuckerberg, a Meta está recrutando uma equipe de elite para desenvolver um modelo de IA que ultrapasse, literalmente, as capacidades humanas. Nada de replicar o cérebro: a ambição aqui é superá-lo. Trata-se de um objetivo que faz corar até mesmo os veteranos do Vale do Silício, hoje mais concentrados em modelos “apenas” equivalentes ao intelecto humano.

Essa guinada agressiva acontece em um momento…

Sobre o autor

Matheus Spiess

Estudou finanças na University of Regina, no Canadá, tendo concluído lá parte de sua graduação em economia. Pós-graduado em finanças pelo Insper. Trabalhou em duas das maiores casas de análise de investimento do Brasil, além de ter feito parte da equipe de modelagem financeira de uma boutique voltada para fusões e aquisições. Trabalha hoje no time de analistas da Empiricus, sendo responsável, entre outras coisas, por análises macroeconômicas e políticas, além de cobrir estratégias de alocação. É analista com certificação CNPI.

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